* Curta homenagem a Simões Lopes Neto
O vermelho do horizonte pedia o fim de tarde. Ia-se o dia. Eu, que nem de mim me lembrava, quis me rever: quem sou eu nesse poente?
Senti os pés doídos das andanças e das estradas de perder juízo, dos arretamentos das bailantas. Era um retirante, passo-e-despasso, nuns tantos cascos de potro.
“Ah, mas que guria nova é flor!”. Inda ontem, fui ter Maria Antônia: o rodopio no galpão, o vestido de algodão rendado, o leite de rosas no cheiro do cangote; e a gaita gritando as harmonias, o dedilhado assanhado do violão. Pra depois deitar entre aquelas coxas e me jorrar em gozo morno.
Parti na madrugada, feito e cumprido, no meu jeito de ser, sozinho, que é como os mais-de-si encaram a custódia de vida, sem mais alguém de arrasto.
Tudo é mais distante quando se anda em solidão. E vem cansaço.
Abanquei-me, um impar de horas depois, ali onde São Francisco de Paula desiste da curva. Pois que cantei baixinho, uma milonga talvez, defronte ao fogo de chão, enquanto o luzeiro do povoado se escondia atrás da neblina.
A noite pedia almas. Ouvi pelas horas as fofocas das comadres trêsmarias, até o último palheiro queimar. Enrosquei no pala aquele sono que me vinha, pensando no cheiro de moça sem lar. Fui tosquiando a consciência, entre bocejos, desgarrando o barco dos sonhos daquele fiapo de vida, endurecendo a carne, esfriando o sangue, descuidando o fogo. Até o vozerio da vila não confessar mais novidade.
Fui ginete. Fui cantor. Tive tantas Maria Antônias que ganhei as contas. Tantas andanças que nem sai do lugar. Tantas estradas que todo o lugar era casa. Fui esse e aquele, no meu jeito de dizer tudo sem falar nada. A última lida antes de Deus? Chegar. Pois chegar já é partir.
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