terça-feira, 1 de março de 2011

Os Despertos - Fragmento 8

Thales manteve a ironia no canto do sorriso. O que dizia, fazia algum sentido, sem abrandar a minha inquietação. Inteligente e eloqüente, sem dúvida, mas o modo de se manifestar era incomum. Ele se interessava. Diferentemente de tantos outros que, ao socializar, exercitavam essa espécie de cinismo tão comum, que fala sem sentir, responde sem entender, e pergunta apenas para dar ao diálogo a sensação de movimento.


— Então, estamos socializando, certo? Mas não vê o quanto é despropositado tudo isso? Pessoas que pouco se conhecem não travam conversas desse tipo.

— Pois bem, entendo seu ponto. Há a regra, mas há também a exceção. Olhe para nós! Somos exceção, não é mesmo? Olha – continuou como se tivesse lhe ocorrido um argumento contundente – Muita gente deve pensar nessas coisas, mas se expressam e se comportam de modo simples. Você vê essa limitação no olhar. Aliás, foi assim que percebi que você era um tanto diferente: pelo olhar!

— Bem, filósofo, isso não justifica tanto assim esse diálogo despropositado. Não quero falar sobre essas coisas – percebi que o frio já começava a irritar a minha nuca e resolvi convidá-lo para uma bebida pela simples razão de entrar no bar e me livrar do vento gelado. Ele recusou. Disse que sua mulher o esperava e que não era do seu feitio freqüentar bares. Mesmo assim, talvez por simpatia, me deu seu endereço, convidando-me para visitá-lo qualquer dia. Eu agradeci, pensando que seria a última vez que o veria. Ele despediu-se.

Enquanto se afastava, pensei que, afinal, aquilo fora divertido. Talvez ele percebia que eu o observava descendo a rua. Girei nos calcanhares para alcançar a rua que fazia esquina com o Kalith.

(Fim da Parte III)

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